Mostrando postagens com marcador geopolítica. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador geopolítica. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

As Origens da Ideologia Mais Mortal do Mundo | Prof. David N. Gibbs

Realmente esse foi um excelente trabalho de utilidade pública prestado pelo Canal Neutrality Studies Português.

Essa entrevista traduzida para o português denuncia algo não falado pela mídia hegemônica sobre uma ideologia que move mentes e corações, e principalmente capital financeiro e poder em todo o planeta, os neocons.


"O neoconservadorismo é uma ideologia incrivelmente brutal e sedenta de sangue. Mas como essa mentalidade louca e monstruosa dominou uma nação inteira que se orgulha de ser o ápice dos valores humanísticos? Bem, nem foi difícil. 

O professor David N. Gibbs nos conta a história de origem dos demônios que são os neocons. O Dr. David N. Gibbs é professor de História na Universidade do Arizona. Ele escreveu vários livros importantes que nos ajudam a entender os Estados Unidos contemporâneos; entre eles "Revolt of the Rich: How the Politics of the 1970s Widened America's Class Divide." e o que queremos focar hoje, "First Do No Harm: Humanitarian Intervention and the Destruction of Yugoslavia." 

Siga David N. Gibbs através da página inicial: dgibbs.arizona.edu"



quarta-feira, 30 de outubro de 2024

O legado de Hugo Chávez e a Venezuela atual

 






Por Kátia Alves Fukushima[1]

No dia 05 de março de 2023, completaram-se dez anos da morte de Hugo Chávez. Então, recebi o convite para escrever sobre o legado de Chávez e os desdobramentos na política da Venezuela, um dos temas que tem ocupado minha agenda de pesquisa há um tempo[2]. A grande dificuldade de se analisar a situação venezuelana são as informações enviesadas com as quais nos deparamos, sejam aquelas pró-governo ou aquelas que seguem a mídia hegemônica atribuindo à figura de Hugo Chávez todos os males do país e, quiçá, do mundo.      

Coincidentemente, me deparei com um artigo de Margarita López Maya (2023) que me chamou muito a atenção: a autora reduz o legado do governo de Hugo Chávez ao que seria “uma nova forma de autoritarismo sob Nicolás Maduro”. Ela afirma que a forma com que Chávez exerceu o poder, desde o seu primeiro mandato, deteriorou as “instituições democráticas liberais”, o que explica, em sua visão, a “deriva autoritária de Maduro”.      

Análises semelhantes apresentam os mandatos de Chávez e de Maduro como um único governo, como a de Norris e Inglehart (2019, p. 415) que na ânsia de classificarem Chávez como líder autoritário-populista, afirmam que “na Venezuela, Hugo Chávez prometeu redistribuição de riqueza, reforma agrária e uso das receitas do petróleo do Estado para subsidiar os padrões de vida, mas o país experimentou um declínio econômico drástico”. No entanto, este declínio econômico drástico ocorre somente no governo de Nicolás Maduro.

Essas análises são problemáticas por, no mínimo, três razões. Primeiro, ainda que Chávez e Maduro sejam figuras de um mesmo projeto político, ligados à chamada Revolução Bolivariana e ao Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), reduzir o governo Chávez e o que ele representou, única e exclusivamente, ao governo Maduro e à atual crise venezuelana, é a meu ver, uma análise reducionista, pois perde de vista, a complexidade e a contextualização do processo político em que eles se inserem. Segundo, a ideia de deterioração das instituições democráticas liberais me remete a duas questões: de que instituições democráticas estamos falando? A deterioração dessas instituições já não começou antes do próprio governo Chávez? Por fim, diante da crise venezuelana, é fácil colocar a culpa somente no governo e afirmar que este fracassou, mas qual foi o papel da oposição nesse processo?

Isto posto, busco argumentar nesse breve artigo que, primeiro, para entendermos o governo e o legado de Hugo Chávez, bem como a situação da Venezuela hoje, se faz necessário olhar (não só) para os erros, limites e contradições desses governos, mas também para o papel da oposição. Isso porque há uma lacuna nas análises sobre os governos de Chávez e de Maduro ao ignorarem as ações da oposição que, a meu ver, contribuíram para o acirramento da crise política e econômica no país, ao atuar enquanto “oposição desleal” ao longo dos governos de Chávez (1999-2013) e de Maduro (2013 – atual), na medida em que, para além de se contrapor ao governo dentro das regras do jogo, se colocou como uma ameaça à própria democracia.

Em segundo, defendo que analisar a democracia venezuelana, ou melhor, as democracias na América Latina, a partir de uma concepção de democracia liberal no seu sentido mais restrito aos procedimentos e, portanto, à arena eleitoral, é problemático. Isso porque, com essa visão restrita, perde-se de vista um importante processo de disputas de narrativas entre uma cultura hegemônica excludente e um conjunto de vozes até então marginalizadas, advindas de um processo de lutas dos movimentos sociais por democracias participativas e inclusivas e que, em distintos graus, ganharam espaço durante os governos de esquerdas. Neste aspecto, as reações a estes governos estão relacionadas mais a essa disputa de narrativas – diante de uma ameaça a essa cultura hegemônica – do que, de fato, aos erros destes governos.


Governo Chávez: o que representou e qual seu legado?

Hugo Chávez governou a Venezuela por 14 anos (1999-2013), tendo sido eleito com 55% dos votos para mais um mandato (2013 a 2019) que, todavia, vítima de uma enfermidade, faleceu antes de tomar posse. Durante esse período, Chávez apresentou significativa legitimidade perante a população, demonstrada pelas sucessivas vitórias entre eleições e referendos (vencendo 15 processos eleitorais dos 16 realizados durante seus mandatos).

Vale lembrar que Chávez se insere no chamado giro à esquerda, ou maré rosa (Panizza, 2006), no final do século XX e início do século XXI, em que várias lideranças e partidos de esquerda e centro-esquerda assumiram o poder em diversos países da América Latina. Chávez ascendeu ao poder dentro das regras da democracia liberal, em um contexto de crise do sistema político venezuelano[3] e deslegitimação dos partidos tradicionais, Ação Democrática (AD) e o Comité de Organização Política Eleitoral Independente (COPEI), que se alternavam no poder no chamado “sistema populista de conciliação de elites” (Rey, 1998). Seu governo não conseguiu implementar mudanças estruturais, que verdadeiramente ameaçassem o sistema capitalista, e nem superar a economia rentista, com base nos recursos do petróleo. No entanto, por si só, representou, em um país historicamente governado por forças oligárquicas e conservadoras, uma mudança na ordem institucional, ao mudar o bloco no poder e construir uma nova hegemonia. A ruptura com o status quo até então vigente gerou em torno do governo um constante embate com setores oposicionistas – partidos, setores empresariais e midiáticos.

Uma das primeiras medidas de Chávez ao assumir o poder presidencial da Venezuela foi convocar uma Constituinte e promulgar uma nova Constituição com aprovação popular por meio de referendo. Podemos dizer que a Constituição de 1999 é um dos principais legados de Chávez e, com ela, o debate sobre a concepção de democracia para além de seus aspectos procedimentais. A Carta Magna apresenta uma série de mecanismos de inclusão e participação, como a garantia de três cadeiras na Assembleia aos povos indígenas e os mecanismos de consultas populares e iniciativa de leis, além do referendo revogatório – instrumento importante, nas mãos dos cidadãos, que permite revogar o mandato de todos os cargos de eleição popular. Ainda que, como aponta López Maya (2023), esta Constituição tenha sido resultado de um amplo debate social, político e institucional que vem desde a década de 1980, dar respaldo as ideias de democracia participativa neste processo não é pouca coisa[4].

Destaco também as chamadas Missões Bolivarianas – uma série de políticas sociais – que, sem ignorar os problemas internos de gestão, promoveram avanços significativos na vida dos venezuelanos no que se refere ao acesso à educação, saúde e emprego, reduzindo, assim, as taxas de pobreza e desigualdade no país. A pobreza, por exemplo, que atingia 49,4% em 1999, se viu reduzida a 29,5% em 2011. No mesmo período, a taxa de indigência diminuiu de 21,7% para 11,7%. No intervalo da crise do governo com a oposição, a taxa de desemprego alcançou, no ano de 2003, 18%. Após esse período e, justamente, quando se iniciaram as Missões Bolivarianas, a taxa de desemprego começou a cair expressivamente, chegando a 8% em 2012. A redução da desigualdade foi significativa comparada aos outros países da América Latina, como podemos verificar no índice de Gini[5], em que a média dos países latino-americanos foi de 0,512 em 2010 e a Venezuela, no mesmo ano, estava abaixo dela com 0,394 – quanto mais próximo de zero, menos desigual.

Essas Missões somadas às políticas de estímulo à participação, com a criação de instituições participativas, como os Conselhos Comunais, constituíram o eixo do projeto político chavista. Para tanto, o Estado assumiu, neste período, o papel central na promoção dos direitos sociais, bem como na regulação das relações econômicas.

Mesmo que muitas políticas adotadas pelo governo tenham representado a “cooptação” da população para reverter em apoio político à figura de Chávez, os dados mostram que produziram resultados positivos para os venezuelanos, em especial para os grupos marginalizados. Ademais, se partimos da premissa da função educativa da participação – “Quanto mais os indivíduos participam, melhor capacitados eles se tornam para fazê-lo” (Pateman, 1992, p. 61) – podemos afirmar que a presença desses mecanismos participativos pode contribuir para o aperfeiçoamento da participação popular. Assim, apesar das contradições presentes nas instituições participativas, podemos afirmar que a ideia de participação foi internalizada na vida social, institucional e psicológica dos venezuelanos – outro legado do governo Chávez.

Todavia, tais políticas, como a literatura demonstrou, estavam imersas na polarização política e social entre governo e oposição presente durante todo o governo Chávez. Parte deste embate, como mencionei, se relaciona à disputa de narrativas entre aqueles que queriam manter o status quo e, logo, uma cultura excludente, e aqueles que, a partir das políticas de inclusão e participação, passaram a ocupar lugares que não eram considerados seus e a reivindicar uma democracia mais substantiva, gerando um constrangimento naqueles que sempre tiveram o privilégio de estarem nestes lugares. Setores abastados começam a se sentir ameaçados e, logo, vão aceitar qualquer alternativa que mantenha o seu status quo, ainda que essa opção represente a quebra da própria democracia, apoiando, por exemplo, uma oposição desleal.

Mas, como disse, não pretendo minimizar os erros do governo. Vários fatores contribuíram ou acirraram para o descontentamento de vários setores e abriram espaços para a atuação de uma oposição desleal, como a concentração do poder no Executivo. A adoção da reeleição indefinida também foi um grande erro do governo Chávez, e que tem sido um tiro no pé de muitas lideranças que têm buscado esse caminho. Tal medida, a meu ver, enfraquece tais governos, pois ao ficar dependente de uma única liderança, não contribui para a formação de quadros fortes no interior dos partidos.


Oposição “Desleal”

Como argumentei, não é possível analisar a crise venezuelana somente a partir dos governos chavistas sem dar atenção ao papel da oposição política e econômica, que se converteu em uma “oposição desleal” ao longo dos governos de Chávez e de Maduro.

A “oposição desleal”, segundo Linz (1991), constitui-se em partidos e/ou grupos de interesses que promovem ação conjunta com fins desestabilizadores para derrubar o governo, sem nenhuma possibilidade de constituir uma nova maioria. De acordo com o autor, não é improvável que, diante de uma oposição desleal e dos perigos que esta pode causar, o governo, buscando salvar o regime, caminhe em uma direção autoritária. No limite, estas ações podem levar à queda de presidentes ou ao fechamento do governo em direção ao autoritarismo.

Quando Chávez começou, de fato, a implementar as políticas que havia anunciado em sua campanha eleitoral, muitos setores começaram a se sentir ameaçados, dentre os quais, podemos citar: os partidos de oposição, setores empresariais (representados pela Fedecámaras – Federação Venezuelana de Câmaras de Comércio e Produção); setores midiáticos (ligados aos jornais e redes de televisão: El Nacional, El Universal, Globovisión, RCTV, Venevisión); lideranças da Petróleos de Venezuela S.A. (PDVSA)[6] e da Confederação dos Trabalhadores da Venezuela (CTV), além de setores da classe média. Dentre as ações promovidas por essa oposição que a converte em desleal, citamos: as paralisações em 2001, o golpe que destituiu Hugo Chávez do poder entre 11 e 14 de abril de 2002, a sabotagem petrolífera entre 2002 e 2003, e o boicote às eleições parlamentares em 2005.

Após o fracasso dessas ações e medidas visando à desestabilização, a oposição à Chávez havia adquirido um caráter mais democrático nos últimos anos de seu governo. Tal estratégia, em muito localizada na união de setores oposicionistas em torno da Mesa de la Unidad Democrática (MUD), levou a uma considerável melhoria nos seus resultados eleitorais. A oposição, neste sentido, não apenas conquistou o poder em estados importantes do país, como tornou reais suas chances de vitória nas eleições presidenciais. A MUD logrou reunir todos os setores descontentes com o governo chavista, criando em torno da candidatura do então governador do estado de Miranda (2008-2012), Henrique Capriles, a personificação do líder anti-Chávez.

No entanto, após a morte de Chávez e a derrota na eleição presidencial de abril de 2013 para Nicolás Maduro, a oposição ficou dividida[7] e alguns setores retornaram ao antigo caminho, não reconhecendo o resultado das eleições e incitando protestos violentos contra o governo – conhecidos como “La Salida” (2014). Houve também um boicote as eleições de 2018 e, em 2019, Juan Guaidó (Voluntad Popular – PV), um dos líderes da oposição, se autoproclamou presidente e passou a defender intervenção estrangeira no país.

A relação entre oposição e governo na Venezuela se constitui em um jogo de soma zero, que leva a um círculo vicioso entre ações antidemocráticas por parte da oposição e o endurecimento por parte do governo. Quem sofre as consequências desse jogo é a população venezuelana. 


Venezuela hoje

Após a morte de Chávez em 2013, Nicolás Maduro – vice-presidente e ex-ministro de Relações Exteriores – foi eleito no mesmo ano com 50,62% dos votos. O governo de Maduro foi marcado por uma grave crise econômica que se instaurou em 2014[8] – com uma das inflações mais altas do mundo, desabastecimento e inseguridade. Uma série de fatores podem explicar a crise política, econômica e social venezuelana, como a dependência do petróleo, as influências internacionais e a inabilidade dos atores governistas de encontrarem soluções para a crise, bem como o papel da oposição ao acirrar ainda mais a polarização e a crise no país.

Neste sentido, entender a Venezuela hoje e a crise política, econômica e social perpassa por quatro dimensões: 1) relação governo e oposição; 2) papel dos militares no governo; 3) distanciamento entre “chavismo burocrático institucionalizado” versus “chavismo popular” e; 4) interesse dos EUA no fim do chavismo.

Como apontamos, a relação entre governo e oposição sempre foi marcada por intensa polarização, constituindo um jogo de soma zero.

O governo Maduro, na luta para se manter no poder, não enfrentou temas centrais para tentar superar a crise econômica, respondendo de modo letárgico aos desafios econômicos do país, especialmente no que diz respeito à necessidade de ajustar os controles de preço e câmbio que se prestam à especulação, contrabando e corrupção (Ellner, 2019, p. 169).

Este último tema, somado à falta de transparência, constitui outro “calcanhar de Aquiles” do governo. Segundo o sociólogo venezuelano Edgardo Lander, durante o governo Maduro houve um aumento da militarização, com a incorporação de membros das Forças Armadas em cargos da administração pública, buscando garantir o apoio dos militares ao governo. Nestes cargos houve níveis mais altos de corrupção, com destaque para as áreas de alocação de divisas, portos e de distribuição de alimentos, gerando uma deterioração dos serviços públicos e, logo, uma crescente rejeição ao governo Maduro.

As dificuldades do governo em solucionar a crise econômica, segundo Oscar Lloreda (2019), se reflete em um distanciamento entre dois grupos, que ele denomina de “chavismo burocrático-institucionalizado” e o “chavismo popular”. Para o autor, “o que unifica hoje ambos os grupos é a existência de um projeto e um horizonte comum, traçado ao longo desses vinte anos. O que os separa, em alguma medida, é a preocupação atual de cada um”. Enquanto o “chavismo burocrático-institucionalizado” tem como objetivo central a sua sobrevivência, ou seja, a manutenção do poder institucional, “o chavismo popular” se concentra mais na viabilidade e na ‘sustentabilidade histórica’ do projeto bolivariano”.

Outro fator que acirra a crise venezuelana são as sanções impostas pelo governo dos Estados Unidos. Desde a ascensão de Hugo Chávez em 1999, as relações entre Venezuela e Estados Unidos se caracterizam por tensões diplomáticas, especialmente      após o golpe de 2002 contra o governo Chávez, liderado pela oposição e com apoio do Governo Bush (2001-2009). Durante o governo Maduro, a relação entre os dois países se acirrou, com a imposição de sanções por parte dos Estados Unidos contra o país[9]. Segundo Bull e Rosales (2023), tais sanções inibiram a capacidade da Venezuela de recuperar-se da crise de 2014, contribuindo para a queda de 80% do PIB per capita registrada entre 2013 e 2021.

Para Lloreda (2019), a estratégia dos Estados Unidos se concentra em asfixiar a economia venezuelana e isolar diplomaticamente o país, apostando no colapso interno a partir de pressões externas, pois o esgotamento do chavismo representaria “que não é viável e nem possível a construção de uma alternativa ao modelo hegemônico”.

Diante do exposto, a conjuntura atual coloca o futuro da Venezuela, com eleições previstas para 2024, como uma incógnita. O que posso dizer é que uma solução mínima para a resolução da crise no país perpassa, primeiro, por um diálogo entre governo e oposição no sentido de entender a presença dos dois atores políticos como parte da política venezuelana; segundo, pela luta por acabar com as sanções impostas pelos Estados Unidos e, terceiro, pela recuperação e aprofundamento dos pontos positivos do governo Chávez, mais precisamente, no que se refere às suas políticas de inclusão e participação que deram voz aos grupos excluídos da política venezuelana. Este último ponto, contudo, esbarra, naqueles que querem manter a democracia restrita à arena eleitoral e, portanto, condizente com as desigualdades e exclusão – debate presente nas crises de outros governos de esquerda latino-americanos.

* Este texto não representa necessariamente a opinião do Boletim Lua Nova ou do CEDEC.


Referências Bibliográficas

Bull, Benedicte e Rosales, Antulio. Cómo las sanciones a Venezuela abrieron paso a un capitalismo autoritario. Nueva Sociedad, no 304, marzo-abril de 2023. Disponível em: <https://nuso.org/articulo/304-sanciones-venezuela-capitalismo-autoritario/>.

Ellner, Steve. “Class Strategies in Chavista Venezuela: pragmatic and populista policies in a broader context”. Latin American Perspectives, Issue 224, Vol. 46 No. 1, January, 2019. p. 167–189. DOI: 10.1177/0094582X18798796

Fukushima, Kátia A. A política social do Governo Chávez: quais os avanços? Revista Mural Internacional, v. 9, p. 99-121, 2018.

Fukushima, Kátia Alves. O governo Chávez e a luta pelo poder na Venezuela: uma análise dos atores políticos em conflito. Dissertação (Mestrado em Ciência Política). São Carlos: UFSCar, 2010.

Fukushima, Kátia Alves. Os impasses à democracia participativa nos governos de esquerda: os casos do Brasil, do Chile e da Venezuela. Colombia Internacional, v. 98, p. 105-135, 2019.

Fukushima, Kátia Alves; González Durand, Jorge. Venezuela Hoje: entre a polarização política, as sanções dos EUA e a pandemia do Coronavírus. A terra é redonda, 2020.

Linz, Juan J. La quiebra de las democracias. Argentina: Alianza Estudio, 1991.

Lloreda, Oscar. “Ni Geopolítica, ni petróleo: Lo de Venezuela es un acto ejemplarizante”. Foro de Comunicación para la Integración de NuestrAmérica (FCINA), 2019. https://www.alainet.org/es/articulo/198091.

López Maya, Margarita. Autoritarismo, izquierdas y democracia participativa en Venezuela. Nueva Sociedad, no 304, marzo-abril de 2023. Disponível em: <https://nuso.org/articulo/304-autoritarismo-izquierdas-democracia-participativa-venezuela/>.

Norris, Pippa; Inglehart, Ronald. Cultural Backlash: Trump, Brexit, and Authoritarian Populism. Cambridge: Cambridge University Press, Panapo, 2019.

Panizza, Francisco. La marea rosa. Análise de Conjuntura, OPSA, n°8, 2006.

Pateman, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

Rey, Juan Carlos. El futuro de la democracia en Venezuela. Caracas: Universidad Central de Venezuela, 1998.

Serrano, Rafael Quiroz. Meritocracia Petrolera. ¿Mito o Realidad? Caracas: 2003.


-----------------------------------------------------------------------------


[1] Doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Professora Adjunta do Departamento de Ciência Política – Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro (IFCS/UFRJ). E-mail: kafukushima.politica@gmail.com.

[2] Este texto apresenta ideias já desenvolvidas em outros trabalhos da autora (Fukushima, 2010; 2018; 2019; 2020).

[3] Ao longo da década de 1990, houve expressivo aumento da taxa de pobreza na Venezuela, alcançando em 1999 um total de 49,4%. A taxa de indigência subiu de 14,4% em 1990 para 21,7% em 1999. Os gastos sociais que eram 10,06% do PIB foram reduzidos a 7,3% em 1996. As informações podem ser conferidas no sítio da CEPAL.

[4] Basta olharmos a situação no Chile, que ainda permanece sob uma Constituição advinda da ditadura e que é extremamente restritiva quanto à participação popular.

[5] O índice de Gini vai de 0 a 1, em que 1 representa a máxima desigualdade e 0 a perfeita igualdade. Esta descrição, e  a estatística apresentada na sequência do texto, estão disponíveis no sítio da CEPAL, seguindo pelo menu: Demográficos y sociales > Distribución del ingreso > Índice de concentración de Gini.

[6] A PDVSA, embora, uma empresa estatal, atuava, antes do governo Chávez, como um Estado dentro do Estado (Serrano, 2003).

[7] A despeito dessa cisão, a oposição venceu as eleições parlamentares de 2015, alcançando uma maioria qualificada com 2/3 das cadeiras legislativas. Após a posse, a primeira medida da oposição foi retirar da parede do Parlamento os quadros de Chávez e de Bolívar ou de qualquer vestígio que representasse a hegemonia chavista, adotando uma “política de ressentimento”.

[8] De acordo com a projeção do Banco Mundial, o PIB da Venezuela caiu 17,7% em 2018, com previsão de queda de 25% em 2019, o que implicaria em uma queda acumulada de 60% desde 2013.

[9] Dentre as ações promovidas pelos Estados Unidos contra a Venezuela, podemos citar a apreensão ou confisco de bens e contas do Estado venezuelano no exterior; o bloqueio de transações financeiras relacionadas à Venezuela e; o reconhecimento de um governo interino.

Fonte Imagética: Wikimedia Commons. El pueblo venezolano acompañó los restos de su presidente Hugo Chávez Frías en la Academia Militar. 8 mar. 2013. Fotografia de Cancillería Ecuador.


Fonte: boletimluanova.org

domingo, 7 de junho de 2020

O artista de rua de Manchester, Akse, tem uma mensagem para o presidente Trump quando ele chegar ao Reino Unido

O artista francês, que mora em Manchester há 20 anos, diz que espera que sua última peça envie uma mensagem clara ao presidente


Por Beth Abbit


O artista de rua Akse apresentou o seu último trabalho e espera que envie uma mensagem forte ao presidente Trump em sua visita de Estado ao Reino Unido começar hoje.

Akse - que é responsável por algumas das mais famosas obras de arte de rua de Manchester - criou um enorme mural novo representando Trump gritando na cara de Martin Luther King.

Vários pássaros pintados no estilo do logotipo do Twitter parecem estar voando pela boca do presidente, enquanto uma pomba aparece acima da cabeça do Dr. King.

A peça, intitulada 'Batalha dos Pássaros', foi pintada no mês passado em Talbot Mill, em Castlefield, que atualmente está sendo re-desenvolvida pela Capital and Centric.


Um vídeo anexo, feito pelo diretor Charlie Watts, mostra o lado da parede com a imagem do presidente sendo destruída por uma grande escavadora. Desde então, o muro foi demolido.

Foto: Akse

"Sinto que o mundo está retrocedendo", disse ele.

"Eu criei esse design há 18 meses, mas como a visita de Estado de Trump estava agendada para este ano, Charlie e eu decidimos fazer esse projeto acontecer."

No vídeo de um minuto, Akse explica como ele veio da França para o Reino Unido há cerca de 20 anos.

Falando no curta, o artista diz: "Nasci nos subúrbios de Paris de pais vietnamitas".


"Me mudei para Manchester há 20 anos, onde conheci minha esposa, que é espanhola. Agora temos dois filhos lindos. Preocupo-me com o futuro deles, pois sinto que o mundo está retrocedendo".

Desde então, o muro foi demolido Foto: Akse


"Diria que minha vida tem sido uma jornada de experiências e experiências multiculturais. Hoje não vejo isso como um fardo, mas como uma celebração".

Akse é bem conhecido em Manchester por seus impressionantes murais.

No mês passado, uma pintura representando a personagem de Game of Thrones Arya Stark foi pintada em uma subestação no Bairro Norte .

Akse o criou ao longo de uma tarde na Stevenson Square, no meio da temporada final do drama de fantasia da HBO.

Foto: Akse


Ele esteve por trás de algumas das obras de arte mais distintas da cidade, incluindo um retrato de Mark E. Smith, pintado ao lado de uma loja de Prestwich e um mural de Tony Wilson do lado de fora do Affleck's Palace .

Mais recentemente, seu estilo distinto foi visto em Withington quando ele rabiscou uma imagem do ícone da Factory Records Peter Saville em uma parede ao lado no coração da vila.

E no ano passado, Akse meticulosamente pintou com spray uma imagem impressionante de Uma Thurman na parede de Burnage .

A parede demolida Foto: Akse

Foi pintado sobre uma imagem dele anterior, a de Kevin Spacey, na sequência de alegações de que o ator havia assediado homens jovens.

A imagem - que ainda está do lado da empresa de contabilidade Nurbhai and Co Accountants, em Mauldeth Road - mostra Thurman como o assassino respingado de sangue 'The Bride', que embarca em um 'estrondo estridente de vingança' contra seus agressores.

Thurman é um defensor do movimento 'Me too', que destaca alegações de assédio sexual.




segunda-feira, 18 de março de 2019

As novas confissões de um assassino econômico
















As atividades humanas são determinadas pelo processo de alterar percepções da realidade.

por John Perkins


(traduzido de um texto originalmente publicado em Evonomics)


Meu sucesso como principal economista numa grande firma internacional de consultoria não se deve a lições que apreendi na faculdade. Tampouco se deve à competência de minha equipe de econometristas brilhantes e magos financeiros.

Estas coisa podem ter, por vezes, ajudado. Mas há algo mais que fez isto acontecer. Este algo mais é o mesmo que  alçou George Washington, Henry Ford, Mahatma Gandhi, Madre Teresa, Martin Luther King Jr., Steve Jobs e outros ao auge de seu sucesso.

Este algo mais é disponível para todos nós.

É a habilidade de alterar a realidade objetiva mudando a realidade percebida, o que podemos chamar de Ponte Perceptiva.


                               Realidade Percebida

                     /                                          \


Realidade Objetiva 1            —>         Realidade Objetiva 2



Como descrevi em meu livro As Novas Confissões de um Assassino de Aluguel Econômico, meu trabalho era convencer chefes de estado de países com recursos que nossa empresa cobiçava (tal como petróleo) a aceitar enormes empréstimos do Banco Mundial e suas corporações irmãs. O combinado era que esses empréstimos fossem usados para contratar nossas empresas de engenharia e construção, tais como Bechtel, Halliburton e Stone & Webster, para construir plantas elétricas, portos, aeroportos, estradas e outros projetos de infra-estrutura que trariam grandes lucros para estas empresas e também beneficiariam algumas famílias ricas de cada país (aquelas que possuíam as indústrias e estabelecimentos comerciais). Todos os demais no países sofreriam por que fundos eram redirecionados da educação, saúde e outros serviços sociais para pagar os juros sobre os empréstimos. Ao final, quando o país não pudesse mais amortizar o principal, voltaríamos e, com a ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI), "reestruturaríamos" os empréstimos. Isto incluía demandas para que cada país vendesse seus recursos a preços baratos para nossas empresas, com o mínimo de regulamentação ambiental e social, e que privatizasse suas empresas de serviços e outros benefícios sociais oferecendo-os a nossas empresas por preços reduzidos.

Era uma estratégia de usar a realidade percebida para alterar a realidade objetiva. Nestes casos, a Realidade Objetiva 1 era que os países tinham recursos. A Realidade Percebida era que o uso destes recursos como colaterais aos empréstimos para financiar a construção de projetos de infraestrutura traria crescimento econômico e prosperidade para todos os cidadãos. A Realidade Objetiva 2, entretanto, era que crescimento econômico ocorria apenas entre os muito ricos. Uma vez que estatísticas econômicas (GDP) nesses países se inclinam em favor dos ricos, o fato é que apenas nossas empresas e famílias ricas se beneficiavam. O resto da população sofria. Em muitos casos isto levou à instabilidade política, ressentimento e à ascensão de várias formas de radicalismo e terrorismo.


"A realidade é meramente uma ilusão."


                                       Albert Einstein


Sabemos da física quântica e da teoria do caos que consciência, observação e mudanças na percepção possuem um impacto na realidade física que pode crescer exponencialmente.  A psicologia moderna ensina que a realidade percebida governa muito do comportamento humano. Religião, cultura, sistemas legais e econômicos (como, de resto, a maior parte das atividades humanas) são determinados pela realidade percebida. Quando um número suficiente de pessoas aceita estas percepções ou quando elas são codificadas em leis, possuem um imenso impacto na realidade objetiva.


Atividades humanas – individuais, comunitárias ou globais – são comandadas por este processo de alterar percepções humanas da realidade como meio de  alterar realidades objetivas. Um par de casos de empresas norte-americanas ilustra isto.


Caso 1: Ford Motor Company

Em 1914 a Realidade Objetiva de Henry Ford era: A) sua empresa vendia carros Modelo T que eram produzidos através do processo de linha de montagem por trabalhadores que recebiam salários padronizados irrisórios; e B) por que a linha de montagem era monótona e operários estavam sob muita pressão para reduzir o tempo de fabricação de um carro de 12 horas e meia para menos de 100 minutos, havia uma enorme taxa de desperdício na força de trabalho da empresa.


Então Ford percebeu uma nova realidade. Aumentou o salário de 2,34 dólares para uma jornada de nove horas para 5 dólares para uma de oito – isto num tempo em que todos os outros fabricantes de carros tentavam reduzir os salários de seu trabalhadores. Além de manter os operários em sua linha de montagem, Ford foi motivado por uma segunda percepção. Ele entendeu que a empresa, seus trabalhadores e os compradores vinham todos de uma mesma população e concluiu que "a menos que uma indústria consiga manter salários altos e preços baixos, ela destrói a si mesma – já que, de outra forma, limita o número de seus clientes." Ford percebeu que o aumento do poder aquisitivo de seus operários teria um efeito múltiplo, aumentando também o poder aquisitivo de muitos outros.


Caso 2: Adidas e outros varejistas

Realidade Objetiva 1: estas empresas criam calçados e vestimentas de luxo que são manufaturados por fábricas terceirizadas na China, no Vietnã e em outros países de sweatshops (*).

A Realidade Percebida por parte da administração destas empresas: A) terceirizar produção libera essas empresas de caras responsabilidades trabalhistas e minimiza salários; B) contratando atletas bem pagos para promover produtos equilibra a publicidade negativa gerada por ativistas que reivindicam melhor pagamento para trabalhadores em sweatshops; e C) estas políticas, que são diametralmente opostas às de Henry Ford, maximizam os lucros.

Realidade Objetiva 2: salários abaixo da linha de subsistência e condições de trabalho precárias em fábricas noutros continentes resultam em maior rotatividade de trabalhadores, doenças e publicidade negativa; B) Por impactar negativamente o crescimento econômico dos consumidores, estas políticas destroem oportunidades para novos mercados que resultariam se operários fossem pagos o suficiente para comprar os produtos que fazem, estimulando, ao mesmo tempo, o efeito multiplicador; e C) nem o lucro corporativo nem o crescimento econômico são maximizados em países em que estas fábricas estão localizadas.

Tive a oportunidade de sublinhar a diferença entre os dois casos acima quando uma rádio de Portland, Oregon (sede da Nike) me entrevistou. O âncora indagou "se você pudesse perguntar a Phil Knight, fundador da Nike, uma única questão, qual seria ?"

Não precisei pensar muito. "Olá Phil, por que você não segue o conselho de Henry Ford?" Continuei, "Imagine se, como parte de uma campanha publicitária internacional, esses atletas dissessem coisas como "Em vez de X milhões, eu e um punhado de amigos (outras celebridades Nike) tivéssemos concordado que a Nike nos pagasse Y a menos. Executivos da Nike concordaram com cortes similares. O dinheiro extra iria para o pagamento de maiores salários aos trabalhadores que fabricassem produtos Nike ao redor do mundo. Acreditamos que, apenas fazendo isto, ajudaríamos a fazer um mundo melhor e mais pacífico." Parei.

"Esta é uma ideia incrivel", disse o âncora.


Tive que acrescentar, "Como você acha que isto repercutiria nas vendas da Nike ? E nas do restante da indústria?"


"Tudo está na mente."


         George Harrison


Os dois exemplos acima ilustram como a Ponte da Percepção funciona. Há incontáveis outros. Que vão dos indivíduos às empresas e diretamente aos governos. Atividades humanas são determinadas pelos modos como percepções impactam a realidade física, tanto consciente como inconscientemente. Aqui está um exemplo dos impactos globais que uma realidade percebida nos anos 50 teve em cada geração subsequente em todo o mundo.


Caso 3: Políticas Governamentais dos EUA no Irã

Realidade Objetiva 1: A) Mohammed Mossadegh foi democraticamente eleito Primeiro Ministro do Irã em 1951; B) ele promoveu reformas progressistas incluindo seguridade social, controle dos aluguéis e reforma agrária; C) ele insistiu que empresas petrolíferas estrangeiras pagassem uma parte justa de seu lucro com o petróleo iraniano ao povo do Irã e quando uma delas, hoje conhecida como BP, resistiu, se dispôs a nacionalizar o petróleo.

Realidade Percebida: o governo dos EUA rotulou Mossadegh como comunista, marionete soviético e ameaça à democracia.


Realidade Objetiva 2: A) a CIA derrubou Mossadegh em 1953 e empossou o Xá, um ditador brutal pró-ocidente que “leiloou” o Irã para empresas estrangeiras, inclusive as petrolíferas; B) o descontentamento crescente levou à Revolução Iraniana de 1979; C) o Xá foi derrubado, o Aiatolá Khomeini assumiu o controle, 52 cidadãos e diplomatas dos EUA foram mantidos como reféns por 444 dias, e os EUA e países europeus romperam relações com o Irã e iniciaram sanções contra o mesmo; D) o militarismo islâmico se expandiu rapidamente pelo Oriente Médio nas décadas seguintes; e E) a região inteira foi devastada por guerras e instabilidade política; isto impactou relações entre países distantes do Oriente Médio, incluindo EUA, China, Rússia e grande parte da África e da Europa.

Imaginemos, por outro lado, o quão diferente a situação seria para o Irã, o Oriente Médio, os EUA e grande parte do mundo se a realidade percebida fosse diferente – algo como:

Realidade Percebida: o governo dos EUA apóia as políticas de Mossadegh e anuncia que somente comprará petróleo de empresas que paguem uma parte justa de seus lucros ao povo dos países de onde o extraiam.

A derrubada de Mossadegh pelos EUA resultou numa série de eventos trágicos que poderiam ser considerados danos colaterais. Em minha opinião, tais consequências ocorrem por que as pessoas que tomam decisões não entendem completamente a força da Ponte de Percepção.

Como consultor de empresas, governos, executivos e palestrante em programas de MBA e outros, descobri que dar uma boa, profunda olhada no impacto da realidade percebida na realidade objetiva é um dos mais eficientes processos que indivíduos, negócios e outras instituições podem empregar para atingir seus verdadeiros objetivos. Me espanto com o quanto das realidades percebidas nos negócios foram alteradas desde que eu estava na faculdade no fim dos anos 60.


Fui ensinado que um bom CEO ganha um retorno decente para seus investidores ao mesmo tempo em que garante que sua empresa seja um bom cidadão, i.e., que sirva ao interesse público. Apreendemos a cuidar de nossos empregados dando a eles seguro saúde e aposentadoria, a tratar nossos fornecedores e clientes com profundo respeito e a honrar a ideia de que bons negócios são um jogo de ganha-ganha para todas as partes interessadas. Em muitos casos, CEOs garantiam que suas empresas não apenas pagassem seus impostos justos mas que, além disso, contribuíssem com escolas locais, instalações recreativas e outros serviços.

Tudo isto mudou quando Milton Friedman ganhou, em 1976, o Prêmio Nobel de Economia e afirmou, entre outras coisas, que a única responsabilidade nos negócios era maximizar os lucros, independentemente de custos sociais e ambientais. Esta é uma realidade percebida que passou a definir os negócios. Ela convenceu os executivos corporativos de que eles teriam o direito – alguns diriam até a obrigação – de fazer tudo o que julgassem que maximizaria os lucros, incluindo comprar agentes públicos por meio do financiamento de campanhas políticas, destruir o meio ambiente e devastar todos os recursos dos quais seus negócios dependam.


Tal realidade percebida resultou num sistema econômico global falido, a um passo de consumir a si mesmo até a extinção – ao que alguns economistas chamam de Capitalismo Predatório.

É hora de inverter isto. Que tal:

Realidade Objetiva 1: as geleiras estão derretendo; os oceanos subindo; menos de 5% da população mundial vive nos EUA e consumimos cerca de 30% dos recursos enquanto metade da população mundial vive em pobreza; e a base de recursos que alimentam a economia está em rápido declínio.

Realidade Percebida: A) quando Milton Friedman formulou a maximização dos lucros em 1976, o capital financeiro era visto como escasso enquanto a natureza era considerada abundante, e a habilidade do planeta em absorver poluição e prover recursos naturais era considerada praticamente ilimitada. Desde então, isto mudou;  B) podemos construir uma economia que recompense negócios que limpem a poluição, regenere ambientes devastados e desenvolva novas tecnologias para energia, transporte,  comunicações, comércio e praticamente todo o resto – que recicle em vez de estragar o planeta; e C) a responsabilidade dos negócios é servir ao interesse público ao mesmo tempo em que ganha taxas decentes de retorno para investidores que desenvolvam uma economia como a definida em B) acima.

Realidade Objetiva 2) um sistema econômico que caminha para o desastre é convertido em um que é em si uma fonte renovável.


A história de sucesso dos humanos (como indivíduos e comunidades) gira em torno das relações entre realidade percebida e realidade objetiva. Neste momento crítico da história, é essencial que construamos Pontes de Percepção que nos levem a um mundo que gerações futuras queiram herdar. O entendimento de mudanças simples na percepção trazem alterações monumentais na realidade objetiva. Também achamos que criar um mundo melhor e não apenas possível, mas divertido e inspirador.

* * *

*(nota da tradução): a expressão intraduzível sweatshop (textualmente, oficina de suor) se refere a plantas industriais altamente insalubres existentes no sudeste asiático que produzem, a custos irrisórios (pois ignoram sistematicamente direitos trabalhistas e condições de trabalho), artigos comercializados a preços altos por grifes importantes em mercados afluentes. Um caso célebre ocorreu quando, anos atrás, a Nike ofereceu a seus clientes um calçado esportivo em cujo preço estaria incluído o bordado, junto à marca, de quaisquer palavras que os mesmos quisessem. Se aproveitando da brecha, dois compradores independentes pediram, então, que a empresa bordasse nos calçados, ao lado da marca Nike, a expressão sweatshop – ao que a empresa, é claro, se recusou, gerando, à época, importantes processos judiciais (bem ao gosto dos norte-americanos) nos quais consumidores lesados pela publicidade enganosa exigiam o cumprimento da promessa. Procurando um link que resumisse o caso, encontrei muitos, inclusive um texto de Elio Gaspari. Mas são tantos (inclusive do Guardian (aqui e aqui) e da wikipedia) que ficou difícil selecionar um só. Sugiro, então, aos mais curiosos, que digitem em qualquer buscador as palavras Nike, sweatshop e case. Vale a pena se inteirar da polêmica antes de comprar sua próxima peça de indumentária esportiva.


* * *



Como principal economista de uma grande firma de consultoria internacional, John Perkins assessorou o Banco Mundial, as Nações Unidas, o Fundo Monetário Internacional, o Departamento do Tesouro dos EUA, empresas das  500 maiores da revista Fortune e líderes de países da África, da Ásia, da América Latina e do Oriente Médio. Seu livro mais recente é The New Confessions of an Economic Hit Man (As Novas Confissões de um Assassino de Aluguel Econômico).



Fonte: impromptu.sul21.com.br


quarta-feira, 6 de março de 2019

É hora dos Estados Unidos invadirem os Estados Unidos


Por: Martín Pastor























Sob a égide da "ajuda humanitária" e da luta pela "democracia", os Estados Unidos justificaram dezenas de intervenções militares e políticas no mundo durante os séculos XX e XXI. Em sua campanha mais recente, eles se concentraram na Venezuela, como parte de uma estratégia para minar governos progressistas na região.


Com a manipulação da mídia coordenada, bloqueio econômico e pressão diplomática tendeu ofensiva imperialista contra a nação latino-americana por mais de uma década. Rotularam o governo venezuelano como uma "ditadura", apresentando-o como um "Estado falido" mergulhado no caos social, com altos índices de pobreza, desnutrição e insegurança; argumentando que a causa é o modelo progressivo e não fatores exógenos, como o bloqueio internacional ou o descrédito.

Para os Estados Unidos e grande parte do Ocidente, estes são motivos suficientes para justificar uma intervenção política e diplomática, que deve ser militar. Então, se estes são gatilhos para intervir, é hora de os Estados Unidos, em defesa dos direitos humanos e da democracia, tomarem a iniciativa de invadir seu próprio país.

A situação na América do Norte é altamente preocupante e classifica a nação como uma receptora adequada de "ajuda humanitária" feita nos EUA. De acordo com um relatório por Philip Alston , relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a pobreza extrema e direitos humanos revelou-se que até 2018, 40 milhões de pessoas no Estados Unidos vivem na pobreza, 18,5 milhões vivem em extrema pobreza e Mais de cinco milhões vivem em condições de absoluta pobreza.

O país tem a mais alta taxa de pobreza juvenil da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a maior taxa de mortalidade infantil entre os estados comparáveis ​​nesse grupo. Não é surpresa que Alston tenha considerado o país como a sociedade mais desigual do mundo desenvolvido.

Nem é que os Estados Unidos não podem mais ser chamados de nação de "primeiro mundo". Segundo um estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), para a maioria de seus cidadãos, aproximadamente 80% da população, os Estados Unidos são uma nação comparável ao "terceiro mundo".

Para chegar a essa conclusão, os economistas aplicaram o modelo de Arthur Lewis, vencedor do Prêmio Nobel de Economia (1979), projetado para entender quais fatores e como classificar um país em desenvolvimento.

De acordo com Peter Temin, co-autor do estudo, o Estados Unidos se reúne este modelo é uma economia dual (diferença única entre uma pequena parte da população e a grande maioria), onde o baixo - sector assalariado tem pouca influência sobre a política pública; um setor de alta renda mantém baixos salários no outro setor para fornecer mão de obra barata; um controle social que é usado para impedir que o setor de baixos salários desafie políticas que favoreçam o setor de alta renda; altas taxas de encarceramento; políticas públicas dos setores mais ricos com o objetivo de reduzir impostos para o referido grupo; e uma sociedade onde a mobilidade social e econômica é baixa.

Especialmente quando um dos principais argumentos para justificar as agressões é o suposto 'bem-estar' e os direitos humanos dos cidadãos. Mais uma vez, os americanos deveriam ver o "raio em seus próprios olhos" primeiro.

Segundo uma análise trienal do Commonwealth Fund (2017), os Estados Unidos, pela sexta vez consecutiva, são o pior sistema de saúde entre 11 países desenvolvidos. Eles têm o sistema de saúde mais caro do planeta, com um gasto anual de três bilhões de dólares, o que resultou em um dos países com maior disparidade no acesso à saudação, com base na renda.

Enquanto a expectativa de vida nos Estados Unidos diminuiu pelo terceiro ano consecutivo, situando-se em 78,1 anos. Uma redução percentual comparável ao período de 1915 e 1918, em que o país enfrentou uma guerra mundial e a pandemia mundial de gripe. Em comparação, Cuba, que faz parte da 'Troika of Tyranny', segundo John Bolton (Assessor de Segurança Nacional), tem uma expectativa de vida de 79,74 anos até 2018.

E na educação, o que falar. De 1990 a 2016, os Estados Unidos caíram do sexto para o vigésimo sétimo, classificando-se como um dos sistemas menos educados do mundo 'desenvolvido'. Com uma despesa pública reduzida, entre 2010 e 2014 de 3%, enquanto o investimento das economias desenvolvidas cresceu mais de 25%.

Um bem-estar de vida deteriorada, um sistema de saúde caro e desigual e uma educação que não se compara a outras nações desenvolvidas. Se isso não for suficiente para que o governo dos EUA e o resto do Ocidente decidam intervir, então as violações constantes dos direitos humanos devem ser uma causa para mobilizar tropas para a fronteira e iniciar bloqueios econômicos.

Os Estados Unidos têm dirigido ou influenciado sistematicamente as intervenções na América Latina e no resto do Sul global. Operações cobertas, guerras étnicas e as mais recentes invasões militares são a prova da 'licença para matar' que foi concedida a este país.

As prisões onde os direitos humanos são violados, como Guantánamo e Abu Ghraib, são apenas exemplos dessa realidade. E figuras como Gina Haspel, que estava diretamente envolvida no programa de tortura do governo dos EUA, subiram para posições de poder global como diretor da Agência Central de Inteligência (CIA).

Mas a transgressão mais clara é a separação do Conselho de Direitos Humanos da ONU, órgão internacional encarregado de assegurar que tais violações não ocorram. Uma decisão que veio dias depois do Alto Comissariado para os Direitos Humanos denunciou a prática atual do governo de separar à força crianças migrantes de seus pais e prendê-las, naquilo que só pode ser chamado de campos de concentração modernos.

Internamente, a responsabilidade da polícia pelo uso de força excessiva foi reduzida, especialmente nas comunidades negras e latinas. A morte sistemática de homens negros nos Estados Unidos por essa força de ordem, de acordo com um estudo da Universidade de Boston, reflete um racismo estrutural subjacente na sociedade americana; Isso também se reflete em um sistema de justiça tendencioso contra as comunidades negras.

"Se a polícia patrulhar as áreas brancas como fazem em bairros pobres negros, seria uma revolução", diz Paul Butler, autor de 'Chokehold: Policiamento homens negros', que diz o que significa ser um homem negro na América.

Essas violações dos direitos humanos são a realidade cotidiana das minorias étnicas e dos grupos historicamente discriminados. Isto é acompanhado pelo fortalecimento de grupos com tendências fascistas, que têm o apoio direto e indireto do governo central e local em vários estados. Um cenário preocupante para milhões de negros, latinos e outros cidadãos étnicos.

No entanto, a falsa "preocupação" com a Venezuela, Líbia, Síria, Iraque, Iêmen, Afeganistão e Ucrânia, somente nessas últimas duas décadas, tem guiado invasões e agressões em nome do bem-estar e dos direitos humanos. Ações que por sua vez carregam interesses ocultos baseados em um indicador no qual os Estados Unidos são sim o número um: gastos militares.

Até 2019, este país tem um orçamento militar de mais de 680 bilhões de dólares, mais do que os orçamentos combinados das sete nações que o seguem: China, Rússia, Arábia Saudita, Índia, França, Reino Unido e Japão.

Nem mesmo na liberdade econômica (12 no mundo) são líderes ou crescimento do PIB (147 de 224 países); o que reflete uma realidade. Os Estados Unidos são um império militar, sua economia é baseada na guerra e nenhuma ação tomada em nome da "ajuda humanitária" tem coerência quando o interesse de seu governo é promover o caos em seu benefício.

Diante dessa situação, o que o mundo está experimentando é o "chute de afogamento" de uma superpotência em declínio. É por isso que ele se esforça tanto para se agarrar ao último bastião de influência que permanece na América Latina, em conseqüência de sua fixação com a Venezuela e outras nações da região. Pois, se fosse uma ajuda real, é hora de os Estados Unidos analisarem seriamente a intervenção, com a mesma intensidade, em seu próprio país.

                                           (Tomado de Rebelión)


Fonte: cubadebate.cu